Criminalização do ICMS declarado e não pago

Gestão Fiscal – Planejamento e Compliance Tributário.
12 de maio de 2020
CARF e suas decisões contrárias as teses firmadas pelo STF e STJ
12 de maio de 2020

Em recente julgamento, precisamente no dia 18/12/2019, foi acatada pela maioria do Supremo Tribunal Federal, a tese de que “O contribuinte que, de forma contumaz, e com dolo de apropriação, deixar de recolher ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do artigo 2, inciso 2, da Lei 8.137.”
Embora o entendimento da maioria dos juristas seja que não há crime nas operações com ICMS próprio, pois a estrutura jurídica desse regime tributário é completamente diversa das operações de ICMS por substituição tributária (ICMSST), o Supremo Tribunal Federal decidiu de forma diferente.
Ao julgar o tema, apesar de utilizar o termo devedor contumaz, o STF não definiu a conduta e sequer deu a entender que pretende fazer tal definição, abrindo uma insegurança quanto as possíveis interpretações acerca deste termo. No entanto, tanto o Poder Judiciário como as legislações estaduais já vem reconhecendo o conceito de devedor contumaz como aquele que já demonstra comportamento reiterado de devedor confesso, não se confundindo com ocasional e temporária inadimplência. O que corrobora com isso são os programas estaduais que avaliam o nível de regularização fiscal ou como muitos denominam o compliance fiscal.
No Estado de São Paulo, há a Lei 1.320/2018 que trata do Programa de Estímulo a Conformidade Tributária, também conhecida por “Lei nos Conformes”, na qual já há uma classificação dos contribuintes do Estado de São Paulo quanto regularização fiscal, que em seu artigo 19 define o “devedor contumaz”.
Nesta legislação, o devedor contumaz é definido por aquele devedor que se enquadra em uma dessas situações, com exceção de débitos com exigibilidade suspensa ou objeto de garantia integral em juízo: (I) possuir débito de ICMS declarado e não pago, inscrito ou não em dívida ativa relativamente a 6 (seis) períodos de apuração, consecutivos ou não, nos 12 (doze) meses anteriores; (II) possuir débitos de ICMS inscritos em dívida ativa, que totalizem valor superior a 40.000 (quarenta mil) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo – UFESPs e correspondam a mais de 30% (trinta por cento) de seu patrimônio líquido, ou a mais de 25% (vinte e cinco por cento) do valor total das operações de saídas e prestações de serviços realizadas nos 12 (doze) meses anteriores.
Levando em consideração a definição pela legislação paulista, constata-se que o “cerco” do Fisco está fechando e causando alardes nos contribuintes e consequentemente no mercado financeiro, visto que qualquer contribuinte, hoje em dia, encontra-se facilmente dentro destas situações. Importante salientar que ainda não se sabe se esses critérios utilizados pelas legislações estaduais será utilizado para apurar, nos casos criminais, a contumácia dos devedores ou se esta será apurada caso a caso com base em outros critérios.

Há ainda a questão dolo (intenção de cometer o crime), pois não basta ser tãosomente devedor contumaz, tem que existir a caracterização do dolo de apropriação na conduta.
Novamente, o STF utiliza o termo “dolo do contribuinte” mas também não o define, criando dúvidas e insegurança nas interpretações. Alguns Ministros apenas citaram em seus votos que caracteriza o dolo, a conduta reiterada que envolver artifício fraudulento; que impossibilite a cobrança; que prejudique a livre concorrência, fazendo da sua inadimplência seu “modus operandi” para manter vantagem competitiva no mercado. Ou seja, o Fisco deve demonstrar que o contribuinte tem consciência e tem a vontade explícita e contumaz de não adimplir com o tributo.
Referido julgamento causou alvoroço entre os empresários contribuintes que muitas vezes não conseguem arcar com a alta carga tributária. No entanto, tais condutas serão apuradas caso a caso, sendo de imprescindível que os contribuintes mantenham a sua escrituração fiscal em ordem a fim de provar, se necessário, que a inadimplência não é proposital mas sim questão de impossibilidade financeira que coloca em risco o exercício de sua atividade empresarial.
Embora o julgamento tenha definido a criminalização do ICMS declarado e não pago, ainda não houve o chamado “trânsito em julgado”, aguardando ainda a modulação dos efeitos desta decisão, levando em consideração o que antes não era considerado crime agora o é, bem como o impacto que causará no mercado financeiro. Desta forma, o STF ainda decidirá se a inadimplência será considerada crime somente após a data do julgamento deste recurso ou não.
Uma vez que não se sabe os contornos que o Poder Judiciário irá dar a partir deste julgamento e como será na prática a apuração do crime, repita-se é de extrema necessidade que os contribuintes redobrem a atenção quanto a apuração e escrituração fiscal para que haja mecanismos de defesa numa eventual ação criminal.

Dra. Cecília C. Garcia Romano

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